A arte de ocultar correntes: como a política aperfeiçoou o disfarce da opressão

O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, ao anunciar a novidade, destacou que os itens são “bonitinhos” e que a proposta tem um tom de gentileza diplomática. No entanto, o verdadeiro problema não é a estética das gravatas e lenços, mas a lógica subjacente à sua criação. Em um país onde os cidadãos enfrentam problemas estruturais em saúde, educação e segurança, é justificável que a Suprema Corte destine recursos a adereços de vestuário para seus ministros?
O gasto de quase R$ 800 mil para a produção de brindes institucionais, incluindo canecas, copos térmicos e agendas, levanta uma questão crucial sobre prioridades. A Constituição Federal e os princípios da administração pública impõem que os recursos sejam aplicados com eficiência e moralidade. Max Weber, ao estudar a burocracia, enfatizou a necessidade de um Estado racional, no qual as instituições operam com impessoalidade e eficiência. O STF, ao se lançar em uma empreitada de grife institucional, parece ignorar essa premissa fundamental.
Além disso, há um ponto ético incontornável. Presentes entre autoridades são um costume internacional, mas quando financiados com dinheiro público, tornam-se uma afronta ao contribuinte. A simbologia do ato se torna ainda mais problemática quando se observa que os itens não estarão disponíveis para venda ao público, ou seja, sua produção não é voltada para a arrecadação de receitas, mas para o agrado de uma elite política e jurídica.
Jean-Jacques Rousseau, ao criticar as desigualdades sociais e a alienação das elites em relação ao povo, poderia encontrar nesse episódio um exemplo contemporâneo de sua tese. Quando as instituições começam a se preocupar mais com a pompa e os rituais do poder do que com sua função primordial, a desconexão entre governantes e governados se aprofunda.
O STF já tem sido alvo de críticas pela ampliação de seus gastos institucionais e pelo distanciamento de sua função essencial, que é garantir o cumprimento da Constituição. O episódio do “STF Fashion” pode parecer banal diante de outros temas mais graves, mas ele simboliza uma mentalidade de uso do aparato estatal para fins que pouco ou nada têm a ver com o interesse público. Afinal, se há recursos disponíveis para presentes luxuosos, por que não há para a celeridade dos processos judiciais, para a modernização da estrutura do Judiciário ou para programas que facilitem o acesso à Justiça?
O Supremo Tribunal Federal deveria ser o guardião dos princípios republicanos, não um clube de magistrados preocupados em padronizar seu figurino. A liturgia do poder exige respeito, e não frivolidade. No fim das contas, quem paga a conta do “STF Fashion” não são os ministros que desfilam suas gravatas e lenços exclusivos, mas sim a população brasileira.
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