A arte de ocultar correntes: como a política aperfeiçoou o disfarce da opressão

Imagem
Desde os tempos mais remotos, a política tem se erguido como o campo privilegiado da disputa pelo comando das consciências, mais do que pela mera condução dos corpos. O enunciado — "A política se tornou a arte de impedir que as massas se apercebam da opressão que sofrem" — sintetiza com precisão a mutação sofisticada do poder: de brutal e ostensivo, como nas tiranias clássicas, para dissimulado e consensual, como nas democracias de fachada e nos regimes tecnocráticos contemporâneos. O poder, que outrora se exercia com a espada e o açoite, hoje se perpetua através da manipulação simbólica, da produção de narrativas e do controle sutil dos desejos e percepções. O século XX foi o grande laboratório dessa transformação. A escola de Frankfurt, sobretudo com Herbert Marcuse e a sua "sociedade unidimensional", já denunciava o surgimento de uma ordem política onde a opressão não mais se sustentava na coerção explícita, mas na fabricação de uma cultura que anestesia e neutra...

Reflexões sobre a expansão das Igrejas e os desafios para educação e saúde no Brasil


O recente levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revela uma realidade intrigante sobre o cenário brasileiro: o número de estabelecimentos religiosos supera a soma das instituições de ensino e unidades de saúde. Com 579,8 mil templos e outros locais de culto espalhados pelo país, contra 264,4 mil escolas e 247,5 mil centros de saúde, a paisagem brasileira nos oferece uma janela para refletir sobre as consequências dessa expansão religiosa em detrimento dos pilares fundamentais do desenvolvimento humano: educação e saúde.

A disseminação de estabelecimentos religiosos, especialmente nas regiões Norte e Nordeste, onde a proporção destes supera em dobro a soma dos de ensino e saúde, sugere uma complexa teia de fatores sociais, culturais e econômicos. A expansão religiosa, marcada pela proliferação de igrejas evangélicas, pentecostais e neopentecostais, é um fenômeno que reflete, entre outros aspectos, a transição religiosa no Brasil. Este movimento, que viu a redução da população católica e o crescimento de outras denominações, não ocorre isoladamente, mas interage profundamente com as dinâmicas sociais e políticas do país.

Filósofos como Max Weber e sociólogos como Pierre Bourdieu oferecem perspectivas valiosas para entender essa questão. Weber, com sua análise sobre a ética protestante e o espírito do capitalismo, pode nos ajudar a compreender como a religiosidade pode influenciar valores sociais e econômicos, moldando as prioridades comunitárias e individuais. Bourdieu, por outro lado, através de sua teoria do capital social, sugere que as igrejas podem funcionar como importantes centros de capital social, onde redes de relacionamentos são formadas e mantidas, oferecendo suporte emocional e até material a seus membros.

No entanto, a predominância de estabelecimentos religiosos em detrimento de escolas e hospitais levanta questões críticas sobre as prioridades de desenvolvimento do país. A educação e a saúde são pilares fundamentais para o avanço social e econômico de qualquer nação. O investimento nestas áreas é essencial para melhorar a qualidade de vida da população, fomentar a inovação e sustentar o crescimento econômico a longo prazo.

A facilidade em estabelecer locais de culto em comparação com a complexidade e os recursos necessários para abrir e manter escolas e unidades de saúde reflete desafios estruturais que o Brasil enfrenta. Este cenário sugere a necessidade de políticas públicas mais eficazes que priorizem o investimento em educação e saúde, garantindo que o desenvolvimento destas áreas não seja ofuscado pela expansão religiosa.

A liderança religiosa, por sua vez, ocupa uma posição única para influenciar positivamente as comunidades. As igrejas podem e devem ser parceiras na promoção da educação e da saúde, utilizando seu capital social para mobilizar recursos e apoiar iniciativas que visem o bem-estar coletivo. A colaboração entre o setor religioso, o governo e a sociedade civil pode ser um caminho promissor para enfrentar os desafios educacionais e de saúde, promovendo uma sociedade mais justa e equitativa.

A reflexão sobre a expansão das igrejas em detrimento de escolas e hospitais nos leva a ponderar sobre o tipo de sociedade que estamos construindo. A valorização da educação e da saúde como direitos fundamentais é crucial para o desenvolvimento sustentável e a construção de um futuro próspero para todos os brasileiros. É essencial que haja um equilíbrio entre as dimensões espiritual, intelectual e física do desenvolvimento humano, garantindo que nenhum aspecto seja negligenciado em favor de outro.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O poder nas mãos erradas: como líderes corruptos degradam as instituições

STF Fashion: o Supremo Tribunal do estilo e do gasto público

A eleição de Zé: quando a simplicidade vence a retórica