A arte de ocultar correntes: como a política aperfeiçoou o disfarce da opressão

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Desde os tempos mais remotos, a política tem se erguido como o campo privilegiado da disputa pelo comando das consciências, mais do que pela mera condução dos corpos. O enunciado — "A política se tornou a arte de impedir que as massas se apercebam da opressão que sofrem" — sintetiza com precisão a mutação sofisticada do poder: de brutal e ostensivo, como nas tiranias clássicas, para dissimulado e consensual, como nas democracias de fachada e nos regimes tecnocráticos contemporâneos. O poder, que outrora se exercia com a espada e o açoite, hoje se perpetua através da manipulação simbólica, da produção de narrativas e do controle sutil dos desejos e percepções. O século XX foi o grande laboratório dessa transformação. A escola de Frankfurt, sobretudo com Herbert Marcuse e a sua "sociedade unidimensional", já denunciava o surgimento de uma ordem política onde a opressão não mais se sustentava na coerção explícita, mas na fabricação de uma cultura que anestesia e neutra...

A mídia como jogador político: o quarto poder em ação


A mídia sempre foi um ator central no jogo político, sendo muitas vezes chamada de "quarto poder" por sua capacidade de moldar narrativas, influenciar a opinião pública e pressionar governos. Desde os panfletos revolucionários do século XVIII até as redes sociais do século XXI, a informação – e quem a controla – tem sido um instrumento estratégico nas disputas pelo poder.

Para pensadores como Michel Foucault, o poder está diretamente ligado ao controle do discurso e da informação. Isso significa que a mídia não apenas reflete a realidade, mas a constrói. A maneira como um escândalo político é enquadrado, o tempo dedicado a determinados temas e a escolha de quais vozes são amplificadas podem mudar completamente a percepção pública sobre líderes e políticas. Essa construção narrativa tem efeitos concretos nas eleições, na governabilidade e até mesmo na estabilidade de regimes políticos.

Nos sistemas democráticos, a mídia pode atuar como fiscalizadora do poder, denunciando abusos e promovendo a transparência. O caso do escândalo Watergate, revelado pelo The Washington Post na década de 1970, exemplifica como o jornalismo investigativo pode derrubar um presidente. Já na era digital, vazamentos como os divulgados pelo WikiLeaks ou pelo The Intercept expuseram bastidores de governos e corporações, muitas vezes provocando crises políticas.

Entretanto, a mídia também pode ser usada como ferramenta de manipulação. No século XX, regimes autoritários compreenderam rapidamente o poder dos meios de comunicação. Adolf Hitler usou o rádio e o cinema para propagar a ideologia nazista, enquanto Joseph Stalin censurava qualquer narrativa contrária ao regime soviético. Hoje, a manipulação não se dá apenas pela censura direta, mas também pela inundação de informações – um fenômeno descrito por Hannah Arendt ao analisar regimes totalitários, onde a desinformação e a banalização da verdade enfraquecem a capacidade de julgamento do público.

As redes sociais trouxeram um novo paradigma, descentralizando a informação, mas também ampliando a propagação de notícias falsas e campanhas de desinformação. O uso de algoritmos para direcionar conteúdos personalizados cria bolhas informativas, onde os indivíduos são expostos apenas a visões que reforçam suas crenças pré-existentes. Isso pode enfraquecer o debate público e favorecer discursos populistas, como apontado por Zygmunt Bauman ao discutir a fragilidade da democracia na era digital.

A relação entre mídia e poder, portanto, é ambígua: pode fortalecer a democracia ao fiscalizar governos, mas também pode ser instrumentalizada para manipular a opinião pública. No fim, quem controla a mídia – seja um governo, uma corporação ou um conjunto de influenciadores digitais – tem uma vantagem significativa no jogo político.

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