A arte de ocultar correntes: como a política aperfeiçoou o disfarce da opressão

Imagem
Desde os tempos mais remotos, a política tem se erguido como o campo privilegiado da disputa pelo comando das consciências, mais do que pela mera condução dos corpos. O enunciado — "A política se tornou a arte de impedir que as massas se apercebam da opressão que sofrem" — sintetiza com precisão a mutação sofisticada do poder: de brutal e ostensivo, como nas tiranias clássicas, para dissimulado e consensual, como nas democracias de fachada e nos regimes tecnocráticos contemporâneos. O poder, que outrora se exercia com a espada e o açoite, hoje se perpetua através da manipulação simbólica, da produção de narrativas e do controle sutil dos desejos e percepções. O século XX foi o grande laboratório dessa transformação. A escola de Frankfurt, sobretudo com Herbert Marcuse e a sua "sociedade unidimensional", já denunciava o surgimento de uma ordem política onde a opressão não mais se sustentava na coerção explícita, mas na fabricação de uma cultura que anestesia e neutra...

O amor ao inimigo como estratégia de poder na política


A frase "Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem" parece, à primeira vista, incompatível com o jogo bruto da política. No entanto, ao longo da história, grandes líderes transformaram esse princípio em uma poderosa estratégia para consolidar seu poder, neutralizar adversários e ampliar sua influência. Na política, amar o inimigo não significa submissão, mas sim inteligência estratégica.

Um exemplo clássico dessa abordagem é a reconciliação promovida por Abraham Lincoln durante a Guerra Civil dos EUA. Em vez de humilhar os estados do Sul derrotados, Lincoln buscou uma reunificação pacífica, compreendendo que a destruição total do adversário gera resistência e instabilidade. Essa mesma lógica foi usada por Mandela ao assumir a presidência da África do Sul: ao invés de perseguir seus antigos algozes do regime do apartheid, ele os integrou ao novo governo, desmontando a resistência da elite branca e evitando uma guerra civil.

Do ponto de vista teórico, Maquiavel alerta que os governantes devem evitar tanto o ódio excessivo quanto a benevolência ingênua. Em "O Príncipe", ele argumenta que um líder deve ser temido, mas não odiado, pois o ódio gera revoltas. Já Sun Tzu, em "A Arte da Guerra", ensina que a melhor vitória é aquela obtida sem precisar lutar – e frequentemente, ganhar a confiança do inimigo é a forma mais eficaz de derrotá-lo.

Na política moderna, essa estratégia é evidente em líderes que cooptam opositores para seus governos, dividindo a resistência e garantindo estabilidade. Franklin D. Roosevelt, por exemplo, ao enfrentar a crise da Grande Depressão, nomeou figuras de diferentes espectros políticos para cargos estratégicos, evitando que se formasse um bloco unificado contra ele. No Brasil, Getúlio Vargas fez algo semelhante ao absorver setores da elite industrial e do movimento trabalhista, garantindo apoio de ambos os lados.

O erro de muitos políticos é subestimar seus inimigos ou tratá-los com hostilidade aberta. Isso só fortalece a oposição e cria mártires. Em vez disso, líderes sagazes convertem rivais em aliados temporários, enfraquecendo sua capacidade de resistência. O amor ao inimigo, na política, não significa moralidade pura, mas sim uma ferramenta para alcançar e manter o poder com inteligência.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O poder nas mãos erradas: como líderes corruptos degradam as instituições

STF Fashion: o Supremo Tribunal do estilo e do gasto público

A eleição de Zé: quando a simplicidade vence a retórica