A arte de ocultar correntes: como a política aperfeiçoou o disfarce da opressão

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Desde os tempos mais remotos, a política tem se erguido como o campo privilegiado da disputa pelo comando das consciências, mais do que pela mera condução dos corpos. O enunciado — "A política se tornou a arte de impedir que as massas se apercebam da opressão que sofrem" — sintetiza com precisão a mutação sofisticada do poder: de brutal e ostensivo, como nas tiranias clássicas, para dissimulado e consensual, como nas democracias de fachada e nos regimes tecnocráticos contemporâneos. O poder, que outrora se exercia com a espada e o açoite, hoje se perpetua através da manipulação simbólica, da produção de narrativas e do controle sutil dos desejos e percepções. O século XX foi o grande laboratório dessa transformação. A escola de Frankfurt, sobretudo com Herbert Marcuse e a sua "sociedade unidimensional", já denunciava o surgimento de uma ordem política onde a opressão não mais se sustentava na coerção explícita, mas na fabricação de uma cultura que anestesia e neutra...

Onde me devo abster da moral, deixo de ter poder



Um ensaio sobre os limites éticos do poder na política contemporânea

No tabuleiro da política, o jogo do poder não se sustenta apenas com estratégia, articulação ou carisma. Há um elemento invisível — mas absolutamente decisivo — que dá legitimidade ao domínio: a moral. A frase “onde me devo abster da moral, deixo de ter poder” ressoa como uma advertência cortante aos que confundem astúcia com impunidade, ou esperteza com autoridade. Quando um governante ou líder político abandona o princípio moral, pode até manter a aparência do poder — mas este já estará ruindo por dentro, corroído pela ilegitimidade.

O poder duradouro, aquele que transforma sociedades e molda gerações, exige coerência ética. Ainda que a política seja, por vezes, o reino do possível e não do ideal, é precisamente nesse conflito entre conveniência e consciência que se mede a estatura moral de um líder. O poder que desconsidera a moral talvez vença eleições, controle narrativas ou imponha decisões. Mas não inspira, não une, não gera fidelidade verdadeira — apenas submissão circunstancial ou obediência por interesse.

Ao contrário do que muitos supõem, a moral não é um freio ao poder. Ela é sua âncora. Quando um líder se orienta por princípios — mesmo em meio à pressão das massas, ao jogo sujo das alianças ou à tentação do populismo — ele se torna forte. Não porque esteja isento de erros, mas porque sua bússola aponta para algo maior que seus próprios interesses: aponta para o bem comum, para a justiça, para a verdade.

O poder moral não se compra, não se decreta, não se negocia. Ele se constrói. E, uma vez construído, tem o poder raro de convocar as consciências, de despertar os corações, de unir os diferentes sob uma mesma causa. Já o poder sem moral é como um castelo de cartas: uma ilusão erguida na vaidade e sustentada pelo medo. Basta o sopro da história — uma denúncia, uma tragédia, um erro revelado — para que ele desabe.

Portanto, na arena política, o desafio não é apenas conquistar o poder. É merecê-lo. E merecê-lo, no mundo real, significa ser capaz de sustentá-lo sem abrir mão da ética, sem abandonar a moral à beira da estrada. A verdadeira liderança não se mede pela quantidade de aplausos ou cargos acumulados, mas pela capacidade de manter-se firme quando seria mais fácil ceder. De manter-se justo quando seria mais conveniente corromper-se.

Onde me devo abster da moral, deixo de ter poder — porque o poder que resta, desprovido de alma, já não é poder: é tirania, oportunismo, teatro. E o povo, cedo ou tarde, sempre acorda.

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